Por Alexandre Pantoja*
A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) nº 45 tomou para si uma pretensa reforma constitucional tributária vislumbrando a criação de um equivocado “novo” Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), e seduzindo a plateia com a extinção do ICMS, ISS, IPI, PIS e COFINS.
Reler a história não é um método contemplativo, senão, é a única forma escorreita de avaliar criticamente a profunda intromissão que decisões políticas impuseram no passado para que, nos dias de hoje, erros claramente previsíveis não façam naufragar o País. A afirmação tem uma aparência tola pela sua óbvia e tão lógica dedução, mas, ao que se nota na festejada PEC 45, estamos a um passo de, infelizmente, abrir mão dos principais alicerces da fundação da República do Brasil.
Lá na distante Constituição de 1891, que não só pôs fim à monarquia, mas às decisões totalitárias do rei, a emancipação do Brasil teve suas bases construídas sob os contornos de dois fundamentos: o da República e o da Federação. A relevância dessa dupla associação na história e no Direito brasileiro é tamanha e evidente a ponto de ter sido reforçada e revigorada em todas as Constituições brasileiras tidas ao largo do tempo.
Até hoje ainda vigente e ao lado do voto direto universal e dos direitos e garantias individuais, a forma Federativa do Estado é regra pétrea protegida contra qualquer Proposta de Emenda Constitucional que tenha intenção de modificá-la.
Contudo e ao que se depreende da PEC 45, o “novo” IBS será um imposto nacional e terá arrecadação concentrada exclusivamente nas mãos da União Federal, mutilando e extirpando a competência tributária e autonomia financeira dos Estados e Municípios.
E é aí que reside escancarada inconstitucionalidade da propalada PEC. Defendida pelos ideários do IBS como a mais moderna alternativa de tributação, na verdade a concentração na instituição e arrecadação do imposto contrapõe radicalmente o conceito histórico de organização descentralizada da Federação por fortalecer um indesejado, anacrônico e nocivo poder imperial da União. Exemplo da história recentíssima é que um dos maiores entraves da reforma previdenciária foi a exclusão dos Estados e Municípios, ou seja, quando a economia não trata a Federação como um conjunto uno, qualquer proposição econômica deixa de atingir seus objetivos.
Por outro lado, a articulação em defesa do IBS não deixa de transparecer que a discussão interdisciplinar é meramente coadjuvante. Uma PEC protagonizada por economistas que consideram “mito”, “risíveis” e “falaciosos” os conceitos jurídicos de Federação e Competência Tributária, propulsionam ainda, inverdades sedutoras como a simplificação do sistema tributário. Por se tratar de reforma por Emenda Constitucional, a Federação e a Competência Tributária devem se manter íntegros e inabaláveis na sua totalidade porque são razões de Estado e não, como se intenta impositivamente por argumentação exclusivamente econômica, triviais aspectos moduláveis ao sabor de uma vaidosa criatividade. No mais, pactos à revelia da Constituição serão para o Direito - e como a história demonstra - sempre inconstitucionais, assim como serão para a economia, ineficientes, e para a filosofia, imorais.
*Alexandre Pantoja é advogado atuante, especializado em Direito Tributário pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo e pela Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (GVlaw).